outubro 29, 2014

raízes (?)

Outros que não eu teriam falado de ‘raízes’… Não emprego esse vocabulário. Não gosto de ‘raízes’ e da imagem ainda menos. As raízes enfiam-se na terra, contorcem-se na lama, crescem nas trevas, mantêm a árvore cativa desde o seu nascimento e alimentam-na graças a uma chantagem. ‘Se te libertas, morres!’ As árvores têm de se resignar, precisam das suas raízes; os homens não. Respiramos a luz, cobiçamos o céu e quando nos metemos na terra é para a apodrecer. (…)

Amin Maalouf, Origens.
img. Dora Maar 

Agradeço à Nádia Sacoor esta referência, num belo encontro nosso, ontem.

outubro 27, 2014

peixe lua


"Para onde vai tudo aquilo que imaginamos ? Voa para trás dos Frigoríficos
Encaixa-se atrás de um tijolo Solto
Enfia-se Misteriosamente dentro de uma garrafa Vazia
É levado pelo Vento até ao cais e apanha Boleia de um navio cruzeiro
Descansa dentro dos relógios dos Avós
Passeia dentro dos Livros de receitas culinárias Agarra-se às copas das árvores no Outono
Para onde quer que vá, há uma coisa espantosa que acontece.
As coisas que imaginamos juntam-se magneticamente às coisas que os outros imaginam
e vão–se unindo devagar, formando uma bola imensa que rebola pelo mundo e fica a
boiar na superfície dos oceanos, onde conversa longamente com o único ser que a
entende, com a sua linguagem estranha e sonhadora…"
O Peixe Lua.

Um espectáculo que explora música vocal de diversas épocas e geografias, desde um fragmento
de um coro grego da Oresteia de Eurípides a peças de música contemporânea, passando
por temas tradicionais ou por uma polifonia francesa do séc. XVIII.
Uma expedição por recantos do mundo onde podemos observar o céu e quase tocar a
Lua mas sempre em busca de algo, de um ser fantástico e fascinante que pode estar
muito perto ou pode mesmo ser um sítio dentro de nós.
“PEIXE LUA” avança no tempo e no espaço como um ritual atemporal, um canto
universal, uma constelação tão familiar quanto bizarra…

De e com interpretação de Carla Galvão e Fernando Mota, um sensibilissimo espectáculo (para antes e muito depois dos 6 anos indicados).
Queremos que volte outra vez, para repetir o mergulho e levarmos connosco quem não o viu.

outubro 21, 2014

não há descanso sem amor














não há descanso 
sem amor,
não há sono 
sem sonhos 
de amor
loucos ou indiferentes que sejamos
obcecados com anjos 
ou máquinas,
o derradeiro desejo 
é amor
(...)

Os corpos quentes 
brilham juntos 
no escuro,
move-se a mão 
para o centro 
da carne,
treme a pele 
de felicidade
e vem-se a alma 
exuberante aos olhos
sim, sim, 
era isso 
que eu queria,
que eu sempre quis ,
eu sempre quis,
regressar
ao corpo onde eu nasci.

"Canção" in O uivo e outros poemas de Allen Ginsberg
numa brilhante tradução de Margarida Vale de Gato para a edição Relógio D'Água.
img. colette saint yves